segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

A Morte Devagar

Morre lentamente quem não troca de idéias, não troca de discurso, evita as próprias contradições.
Morre lentamente quem vira escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajeto e as mesmas compras no supermercado. Quem não troca de marca, não arrisca vestir uma cor nova, não dá papo para quem não conhece.
Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru e seu parceiro diário. Muitos não podem comprar um livro ou uma entrada de cinema, mas muitos podem, e ainda assim alienam-se diante de um tubo de imagens que traz informação e entretenimento, mas que não deveria, mesmo com apenas 14 polegadas, ocupar tanto espaço em uma vida.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o preto no branco e os pingos nos is a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não acha graça de si mesmo.
Morre lentamente quem destrói seu amor-próprio. Pode ser depressão, que é doença séria e requer ajuda profissional. Então fenece a cada dia quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem não trabalha e quem não estuda, e na maioria das vezes isso não é opção e, sim, destino: então um governo omisso pode matar lentamente uma boa parcela da população.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projeto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe. Morre muita gente lentamente, e esta é a morte mais ingrata e traiçoeira, pois quando ela se aproxima de verdade, aí já estamos muito destreinados para percorrer o pouco tempo restante. Que amanhã, portanto, demore muito para ser o nosso dia. Já que não podemos evitar um final repentino, que ao menos evitemos a morte em suaves prestações, lembrando sempre que estar vivo exige um esforço bem maior do que simplesmente respirar.

Martha Medeiros

6 comentários:

Unknown disse...

putz... lindo

lindo e verdadeiro...

é com apurada razão que esse textto mostra o modo como muitos deixam de viver e passar a meramente ocupar espaço

Bernardo Lima disse...

Infelizmente algumas pessoas não tem o prazer da comunicação, quando queriam ter e outros tem, mas não deviam ter..
enfim...

mt bom post!
grande abraço!

Ramon Assis disse...

Perfeito
Tava com esse pensamento
E lhe digo, tive uma vida perfeita, mas a mais ou menos 1 ano e 4 meses começei a morrer lentamente..
E há dias q ando me motivando a voltar a vida, e esse texto está me ajudando bastante...


http://lishadcir2.blogspot.com/

Ramon Assis disse...

Rapaz, coloquei na minha cabeça

Não sei quando vou morrer, pode ser daqui a 7 dias.

Pois bem, tenho uma missão pessoal, iniciada a partir de amanhã.

Tenho 7 dias para fazer tudo aquilo que eu queria caso só tivesse esse tempo vivo, pq talves eu só viva isso mesmo, ou menos.

Faça isso também, dê 7 dias para a sua vida, dê 7 dias para fazer o q vc teme.

Viva 7 dias ao seu jeito, pense na morte q vc consegue.

Karla disse...

Só n gostei mto da parte da sensatez, mas eh beeeem legal!
A crítica a tv eh ótima!

Anônimo disse...

Por que nao:)